Sabe aquela história de que “suas atitudes falam tão alto
que nem ouço o que você diz?” Bem, a vida inteira tenho ouvido que sou uma
pessoa teimosa – afirmação essa que ganha um peso especial por ter nascido no
começo do mês de maio. Assim, por mais que eu sempre tenha argumentado que “não,
não sou teimosa, simplesmente preciso de razões boas para ser convencida”, esse
rótulo tem me acompanhado a vida toda e eu adquiri o hábito de me auto
questionar silenciosa e constantemente: “por que insisto em determinado assunto?
Meus argumentos (tenho argumentos?) são válidos?” são perguntas que me faço
sempre que alguma discussão dura tempo demais ou quando o mundo todo parece ter
uma opinião contrária à minha.
O último episódio do tipo foi a questão do carro. Só para
ajudar a entender o drama, no final de 2012, um ano depois de começar um
trabalho a exatos 22 km de casa, decidi vender meu pequeno possante e adotar um
modo mais sustentável de vida. Afinal, entre sustentar um automóvel a semana
toda na garagem ou cultivar estresse e gasto dirigindo 50 km/dia, preferi desapegar.
Não posso dizer que a mudança tenha sido exatamente fácil. O carro, para mim,
sempre foi um sinônimo de independência, meu companheiro de inúmeras histórias.
Além disso, tive que lidar com a descrença de meus próprios pais de que seria
possível viver sem carro em São Paulo. Mas, a verdade é que depois de cerca de
um ano da decisão, consegui o tal estilo de vida mais saudável, andando de transporte
público, bike e eventuais táxis e algumas caronas. Foi aí que o universo
decidiu que eu tinha passado de fase e deveria ir para um nível mais difícil,
chamado “como viver sem carro em Brasília”, ou, ainda melhor, “é possível viver
sem carro em Brasília?”.
A princípio, todo mundo (no mínimo 9 entre 10 pessoas) me
dizia que não. Distâncias grandes, um trânsito menor que o paulistano, inúmeros
locais sem calçadas e um transporte público com severas restrições fazem com
que o carro seja mesmo o veículo mais prático na capital federal. Além disso, em
questão de moradia, a Asa Norte possui apartamentos mais novos e um pouco mais
baratos do que os do outro lado (mais perto do aeroporto e do trabalho). Sobre
as outras questões, manter um veículo seria um gasto a mais, claro, mas factível.
Então, qual era o motivo desse sentimento tão ruim toda vez que pensava em
voltar a ser motorizada?
Foi durante essa autoanálise que percebi que o problema não era o carro, mas eu. O eu motorizada me lembra aquela pessoa insana,que faz mil coisas ao mesmo tempo, não respira, não pensa, dorme pouco, vira a noite trabalhando,vai para o bar e volta dirigindo... bate o carro. Por sorte, nunca houve nada muito mais sério, mas em uma das vezes em que estava nesse ritmo frenético e exagerei na dose, muito antes da Lei Seca, dormi e quase entrei debaixo de um caminhão parado. O reflexo de último segundo me livrou da batida, mas não de ter aberto toda a lateral do carro, como uma lata de sardinha.
Foi durante essa autoanálise que percebi que o problema não era o carro, mas eu. O eu motorizada me lembra aquela pessoa insana,que faz mil coisas ao mesmo tempo, não respira, não pensa, dorme pouco, vira a noite trabalhando,vai para o bar e volta dirigindo... bate o carro. Por sorte, nunca houve nada muito mais sério, mas em uma das vezes em que estava nesse ritmo frenético e exagerei na dose, muito antes da Lei Seca, dormi e quase entrei debaixo de um caminhão parado. O reflexo de último segundo me livrou da batida, mas não de ter aberto toda a lateral do carro, como uma lata de sardinha.
Eu sempre soube que esse evento tinha me marcado, mas talvez
não imaginasse que era tanto. O resultado disso é que hoje, mesmo que semi
inconscientemente, associo o ter um carro com a possibilidade de voltar a esse
ritmo louco - e se o ditado diz que não se dá asas a cobras, também não deve se dar rodas a quem não tem freio. Obviamente, pesa ainda a questão ambiental,
que fica cada vez mais presente na minha vida, mas o fato é que o carro traz
para mim uma descrição que eu não quero. Não nesse momento. Estou feliz com a
pessoa que tenho me tornado e um carro - pelo menos para mim, no espelho mudaria um
pouco essa descrição. Finalmente tranquila comigo mesma cheguei à conclusão de
que talvez um dia eu pense “como fui boba em perder tanto tempo”, mas, por ora,
seja por teimosia ou não, vou continuar batendo a cabeça na parede -
conscientemente - e ter somente a chave de casa no chaveiro. Partiu, Asa Sul.
Nenhum comentário:
Postar um comentário